sexta-feira, 25 de março de 2011

CAÇADA



Não conheço seu nome ou paradeiro
Adivinho seu rastro e cheiro
Vou armado de dentes e coragem
Vou morder sua carne selvagem

Varo a noite sem cochilar, aflito
Amanheço imitando o seu grito
Me aproximo rondando a sua toca
E ao me ver você me provoca

Você canta a sua agonia louca
Água me borbulha na boca
Minha presa rugindo sua raça
Pernas se debatendo e o seu fervor

Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador

Eu me espicho no espaço feito um gato
Pra pegar você, bicho do mato
Saciar a sua avidez mestiça
Que ao me ver se encolhe e me atiça

E num mesmo impulso me expulsa e abraça
Nossas peles grudando de suor

Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador

De tocaia fico a espreitar a fera
Logo dou-lhe o bote certeiro
Já conheço seu dorso de gazela
Cavalo brabo montado em pelo

Dominante, não se desembaraça
Ofegante, é dona do seu senhor

Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador

Chico Buarque

quinta-feira, 17 de março de 2011

Dia Espacial

Fiz do sol meu ponto partida
Fiz de um nó minha fuga, minha saída
Fiz da tarde uma bela arte
Que nem consigo decifrar

Da janela vendo o espaço sideral
As pessoas na rua levando uma vida normal
Se arrastando num asfalto quente e sem par
E eu parado vendo estrelas no céu a brilhar

Meus olhos tão distantes
Do mundo real
Uma noite marcante
Fora do normal